Reclamar de barriga cheia é uma expressão que eu ouvia muito na minha infância. Sempre que eu questionava uma resposta negativa, minha mãe me lembrava de quantos sim ela já havia me dado. Se eu reclamasse de ter que repetir o cardápio do almoço no jantar, ouvia que muitos não tinham tido nem a oportunidade de almoçar, havia um discurso sobre a fome no mundo, e o privilégio que eu tinha de ter o que comer.
Se eu quisesse um brinquedo novo, era lembrada de quantos eu já tinha ganho.
Com o tempo aprendi a pensar antes de pedir, de raciocinar antes de questionar, e a agradecer antes de querer mais. Na medida do possível, ensinei a meus filhos minhas lições, e eles tiveram que ouvir, como eu, vários discursos sobre o quanto eram privilegiados pelo que possuíam.
A verdade é que, mesmo aprendendo muitas das lições que a vida e as pessoas nos ensinam, e mesmo tendo a Bíblia como referência suprema, ainda assim corremos o risco de reclamar de barriga cheia. Reclamamos que o pneu do carro furou, mas nos esquecemos de quantos não tem oportunidade de ter carro. Reclamamos do calor e do aumento da conta de luz por causa do ar condicionado, mas nos esquecemos de que são poucos os que podem dormir no friozinho de um bom ar condicionado.
Queremos um sofá novo, uma geladeira do último modelo, uma bolsa que todo mundo tem, o carro que é o lançamento do ano! Mas já paramos pra lembrar-se dos namoros com nosso conjugue no sofá velho? Temos a relação de quantas vezes a geladeira já esfriou deliciosos pudins de leite condensado? Aproveitamos bem as outras bolsas do armário? Já revelamos os fotos das viagens com o carro antigo?
Na vida cristã não é diferente: fazemos tantos jejuns para pedir bênçãos, e por vezes nenhum para agradecer os benefícios e livramentos alcançados! Sempre temos pedidos, queremos mais, mas nos esquecemos de quantas vezes o Senhor nos sustentou, dos muitos momentos em que o Espírito Santo nos consolou e confortou.
Nós conhecemos o texto: “Lembro-me da minha aflição e do meu delírio, da minha amargura e do meu pesar. Lembro-me bem disso tudo, e a minha alma desfalece dentro de mim. Todavia, lembro-me também do que pode dar-me esperança: Graças ao grande amor do Senhor é que não somos consumidos, pois as suas misericórdias são inesgotáveis. Renovam-se cada manhã; grande é a tua fidelidade!” (Lamentacões 3.19-23).
Nossos dias em que tudo vai bem são muito mais numerosos do que os dias maus. Porém, se não tivermos cuidado, as lembranças emotivas dos dias difíceis são mais fortes, e passamos a enxergar a vida de forma negativa e desconfiada. Por que apontar mais os erros dos filhos, ao invés de elogiar os vários montes em que acertam? Há esposas cujos maridos são trabalhadores, servos de Deus fiéis, trazendo o dinheiro para ser gasto no lar - e elas sempre reclamam da toalha molhada, do riso alto, quando não falam em separação ou divórcio por causa de coisas pequenas, esquecendo-se de que podemos ser mais felizes quando conseguimos conviver com as manias dos outros.
Antes de reclamar, pare e pense se você precisa mesmo dizer o que pensa. Sua fala vai edificar ou vai dar respaldo para ataques no mundo espiritual? Vai trazer paz ou confusão? Vai aproximar ou afastar seu conjugue de Deus e da igreja? Vai ajudar seus filhos na fé ou vai complicar o relacionamento deles com Deus e a liderança da igreja?
As coisas novas podem esperar, o cardápio pode se repetir, o elogio pode trazer de volta o abraço saudoso de um conjugue ou filho. Encha-se de Deus, da paz que excede todo o entendimento, da alegria que fortalece o ânimo, do amor que afeta o medo, da mansidão e tranquilidade que domina a raiva, da temperança que afeta a dor. Quando você estiver cheio de Deus e de tudo o que ele pode proporcionar, não vai precisar reclamar, pois quem tem Jesus tem tudo (como cantávamos há uns anos). E, se reclamar, estará reclamando de barriga cheia!